Exposição de motivos
Tanto na campanha eleitoral do PSD/CDS, do Chega e da IL, como no Programa do Governo ficou clara a intenção destas forças de substituir a discussão sobre a necessidade urgente do aumento dos salários e pensões, pela discussão sobre impostos. O que estas forças políticas procuram é criar a ilusão de que não é preciso aumentar salários. E vão ainda mais longe, procurando criar a ideia de que há “impostos a mais”, em abstrato, para abrir caminho a uma ainda maior, injusta e escandalosa descida do IRC, dos impostos sobre o capital, os seus lucros, as grandes fortunas e o património de elevado valor.
O que querem é discutir a suposta baixa de impostos como moeda de troca para manter os baixos salários, embalados pela demagogia das grandes Confederações Patronais.
No IRS, o Governo PSD/CDS volta, passado um ano, a apresentar uma proposta que é pouco significativa para a esmagadora maioria da população, e em que a maior redução na tributação se verifica nos escalões mais elevados de rendimentos (8.º e 9.º escalões).
Para isso, contribuem quer as opções relativamente às taxas dos escalões, quer a recusa reiterada de atualizar os montantes da dedução específica repondo os valores que estiveram congelados por 10 anos, prejudicando os rendimentos praticamente até ao limite superior do 6.º escalão.
Para todos os que ganham o Salário Mínimo Nacional e para a esmagadora maioria dos reformados, a proposta do Governo não terá qualquer impacto, e para mais de metade dos trabalhadores o impacto não vai além de 40€ ou 60€ por ano.
Ao mesmo tempo, mantêm-se regimes fiscais de privilégio para rendimentos milionários, de capital e prediais, que continuam a não ser obrigatoriamente englobados; ou para os residentes não-habituais, cujo regime continua a produzir efeitos por opção do Governo de maioria absoluta do PS, também com apoio de PSD, IL e CH.
O debate que é necessário fazer é sobre justiça fiscal. A combinação entre impostos progressivos (em que a tributação é maior quanto mais elevado for o rendimento) e serviços públicos universais (financiados por esses impostos) é a base constitucional para uma política de justiça social, em que a política fiscal deve assumir uma importante função redistributiva.
A realidade atual, em resultado das opções de sucessivos governos, é a oposta: o esforço fiscal pesa mais sobre os trabalhadores e o povo do que sobre os lucros dos grupos económicos e multinacionais e o património de elevado valor.
Por isso, para além do aumento dos salários e pensões, são necessárias medidas de alívio fiscal para quem vive do seu trabalho, para os rendimentos mais baixos e intermédios, e ao mesmo tempo garantir a tributação em Portugal dos lucros realizados no país; acabar com benefícios fiscais para as grandes fortunas e os lucros das multinacionais (ao contrário da intenção declarada do Governo PSD/CDS, da IL e do CH de baixar o IRC e acabar com a progressividade da derrama sobre as grandes empresas).
Assim, no âmbito do IRS, para aliviar os impostos sobre os rendimentos mais baixos e intermédios o PCP propõe:
- O aumento do montante da Dedução Específica de IRS para 5 300€, que corresponde à atualização do seu valor tendo em conta a inflação acumulada que o descongelamento operado no Orçamento do Estado para 2025 não recuperou. Esta medida tem maior impacto proporcional nos rendimentos mais baixos, mas também para os contribuintes abrangidos pelos escalões seguintes até ao 6.º escalão.
- A redução da tributação para o 1.º e 2.º escalões da tabela geral do IRS, que significa um alívio fiscal que aumenta a progressividade, uma vez que, abrangendo todos os contribuintes, é mais significativo para rendimentos mais baixos e intermédios;
- O fim da produção de efeitos do regime fiscal de privilégio atribuído aos residentes não-habituais que, para além de fiscalmente injusto por garantir taxas efetivas mais reduzidas do que as aplicáveis à generalidade da população, tem contribuído para o aumento dos custos com a habitação;
- O englobamento obrigatório para rendimentos do mais elevado escalão de IRS atualmente em vigor (superiores a 83 696 euros anuais), terminando com uma situação em que rendimentos de capital mais elevados podem ser tributados a taxas inferiores a rendimentos de trabalho;
- A fixação, na estrutura do IRS, da taxa adicional de solidariedade (TAS), já hoje em vigor para rendimentos muito elevados (superiores a 80.000€, e num segundo escalão, superiores a 250.000€), aumentando assim para 10 o número de escalões, e aumentando em três pontos percentuais a taxa de IRS aplicável a estes rendimentos.
Assim, ao contrário da proposta do Governo, a proposta do PCP aprofunda a progressividade do IRS. E fá-lo, sobretudo, aliviando a tributação dos rendimentos mais baixos e intermédios, e não o inverso como faz a proposta do Governo, e acaba, também, com a possibilidade de rendimentos de capital do 9.º escalão poderem ser tributados a taxas inferiores às do 5.º escalão, com a introdução do englobamento obrigatório para esses montantes.
Estas medidas introduzem maior justiça na distribuição do esforço fiscal em sede de IRS, beneficiando a maioria da população. São propostas que não esgotam o conjunto das propostas do PCP para uma maior justiça fiscal, em que se incluem e são urgentes as reduções do IVA da energia e das telecomunicações e a revogação de um conjunto de isenções e benefícios fiscais atribuídos ao grande capital, ou o fim de mecanismos que permitem a não tributação em Portugal dos lucros realizados no país.
Com essas propostas de aumento da receita, para além das que constam da presente iniciativa, é possível aliviar a tributação sobre o consumo e sobre rendimentos do trabalho, garantindo ao mesmo tempo que o Estado tem os recursos necessários para garantir a saúde, a educação, a segurança social, a cultura, o desporto, a segurança, a habitação, os equipamentos e infraestruturas públicas, o desenvolvimento e progresso social.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
Alteração do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro;
Revogação dos números 3 a 5 do artigo 236.º da Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
Os artigos 22.º, 25.º, 68.º, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (Código do IRS), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 22.º
[Englobamento]
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- [Novo] Sem prejuízo do disposto na alínea b) do n.º 3, são obrigatoriamente sujeitos a englobamento, para efeitos da sua tributação, os rendimentos referidos nos artigos 71.º e 72.º auferidos por sujeitos passivos residentes em território português, nas situações em que o sujeito passivo tenha um rendimento coletável, incluindo os rendimentos referidos nos artigos 71.º e 72.º, igual ou superior a 83 696 euros.»
Artigo 25.º
[Rendimentos do trabalho dependente: deduções]
- […]:
- 10,15 x (valor do IAS);
- […];
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
- […].
Artigo 68.º
[Taxas gerais]
- […]:
[Rendimento coletável (euro)] | [Taxas (percentagem)] | |
---|---|---|
Normal (A) | Média (B) | |
[Até 8 059] | 12,5 | 12,500 |
[De mais de 8 059 até 12 160] | 16,00 | 13,680 |
[De mais de 12 160 até 17 233] | […] | 16,129 |
[De mais de 17 233 até 22 306] | […] | 18,147 |
[De mais de 22 306 até 28 400] | […] | 21,119 |
[De mais de 28 400 até 41 629] | […] | 25,689 |
[De mais de 41 629 até 44 987] | […] | 27,019 |
[De mais de 44 987 até 83 696] | […] | 35,335 |
De mais de 83 696 até 250 000 | […] | 47,419 |
Superior a 250 000 | 56 | — |
- […].
Artigo 3.º
Norma revogatória
- Em conformidade com o previsto no artigo 2.º, é revogado o artigo 68.º-A do Código do IRS;
- São revogados os números 3 a 5 do artigo 236.º da Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
- A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos com a entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
- Compete ao Governo proceder à alteração das tabelas de retenção na fonte de IRS para o ano de 2025, por forma a ajustá-las às alterações produzidas pela presente Lei, no prazo de 15 dias após a sua entrada em vigor.