Nota do Gabinete de Imprensa do PCP

Governo desvia recursos públicos para a especulação imobiliária, promove o aumento dos preços e da precariedade na habitação

1. As alterações no domínio fiscal que o Governo PSD/CDS pretende promover com o pedido de autorização legislativa entregue ontem na Assembleia da República, constituem uma inaceitável opção pelo favorecimento da especulação imobiliária e da injustiça fiscal.

O desvio de recursos públicos para os fundos imobiliários, a banca e a grande propriedade são o centro deste pacote fiscal que vai ainda mais longe do anunciado no mês de Setembro. 

2. Destacam-se, entre outros aspectos gravosos, os seguintes:

  • Dentro do critério de ”renda moderada”  até 2300 euros, a taxa liberatória (IRS) dos rendimentos prediais destinados a habitação baixa de 25% para 10%, sem qualquer limite mínimo de duração do contrato. Até agora, para ter uma taxa de 10% o senhorio tinha de promover um contrato de pelo menos 10 anos. Para além da injustiça fiscal esta medida é um incentivo aos contratos de curta duração, à continuação da espiral especulativa, ao aumento das rendas de cada vez que troca o inquilino.
  • O alargamento da isenção sobre mais-valias na compra e venda de imóveis  - até agora limitado à habitação própria e permanente - sem qualquer restrição sobre valor ou duração do arrendamento. O que permitirá, a título de exemplo, que alguém que venda um apartamento de luxo, fazendo mais-valias de 1 milhão de euros,  e o coloque a arrendar a 2 mil euros por mês, fique isento do pagamento dessa mais-valia.
  • Ao contrário do que tinha sido anunciado, o Governo avança com benefícios no plano do IRC. A “renda moderada” até 2300 euros passa a ser tributada, em sede de IRC, considerando apenas 50% do seu valor, beneficiando sobretudo as grandes empresas (uma vez que muitas MPME nem sequer têm lucros tributáveis em IRC). Se uma empresa arrendar para habitação (uma vez mais, sem limite de preço ou duração), esse rendimento só conta a 50% para efeitos de IRC, mesmo para arrendamento especulativo ou de luxo.
  • Dentro do critério da “renda moderada” até 2300 euros, os detentores de fundos imobiliários passam a ser tributados em apenas 5% na distribuição dos rendimentos prediais, quando antes eram tributados a 28% (25% no caso do arrendamento habitacional). Até agora, os fundos de investimento imobiliário estavam isentos de IRC, mas os seus participantes pagavam imposto (IRC ou IRS) sobre a distribuição dos rendimentos gerados por estes fundos – um escândalo.
  • Avançam com os chamados Contratos de Investimento para Arrendamento (CIA) com um conjunto de benefícios fiscais, desde logo a possibilidade de isenção de IMT, IMI, Imposto do Selo, do IVA, sendo apenas necessário que 70% da construção seja para arrendamento habitacional (com omissão ao valor do arrendamento) e que seja estabelecido um acordo de 25 anos. É garantido que, caso haja alterações legislativas futuras, os beneficiários destes CIA possam até receber indemnizações.
  • Agravam o regime de “renda acessível”, criado pelo PS, que deixa de ter em conta tipologia, áreas, etc. e passa a ter apenas em conta ser abaixo de 80% do valor de mercado na zona. Ou seja, é um valor completamente ditado pelo mercado. Pela mão do PS, os rendimentos de “renda acessível” já estão isentos de IRS (mesmo que seja um proprietário com dezenas de casas). A fixação de “prazos mínimos de contrato de três anos ou, no caso de residência temporária, de três meses.” só estimulará a sua proliferação. 
  • Agravam o IMT para não-residentes para os 7,5% (actualmente esse valor só é atingido quando o imóvel seja vendido por mais de 1 128 287 euros) mas excluem deste agravamento se for para a “renda acessível” até aos 2300 euros.

3. Para iludir as populações, o Governo pretende ainda fixar a possibilidade do aumento da dedução despesas com habitação para inquilinos no IRS de 700 euros por ano (actualmente) para um máximo de 1000 euros por ano (sendo que será primeiro 900 euros em 2027, e depois 1000 euros em 2028); alargar os critérios de isenção de IMT na primeira habitação, quando esta isenção está actualmente limitada até aos 35 anos de idade; ou com a redução do IVA da construção própria para os 6%. 

Ao contrário do prometido, este pacote fiscal, num mercado habitacional completamente liberalizado e com um parque de habitação público residual (2%), contribuirá para uma espiral inflacionista nas rendas e nos preços das casas. 

4. O PCP sublinha que, perante as consequências da liberalização do mercado de habitação, o Governo propõe ainda mais liberalização. Perante a ineficiência das medidas fiscais, o Governo aprofunda ainda mais a injustiça fiscal. Perante a necessidade de recursos para investir em habitação pública, o Governo entrega esses recursos à gula da especulação imobiliária. Tudo ao contrário do que o País precisa.

O País precisa de outra política para responder à crise no acesso à habitação: investimento em habitação pública que mobilize em média 1% do PIB para este objectivo; regulação do mercado de arrendamento que coloque limites ao valor das rendas e force a sua descida; promoção da estabilidade dos contratos de arrendamento assumindo os dez anos como referência; redução do valor das prestações ao banco com a redução dos spreads e das comissões bancárias (e também dos lucros escandalosos no sector); regulação do Alojamento Local e controlo da carga turística excessiva. É isso que se impõe perante um dos mais graves problemas que os trabalhadores, o povo e a juventude enfrentam no nosso País e não de um pacote fiscal desenhado para servir os interesses daqueles que são os principais beneficiários de uma crise que afecta milhões de pessoas.

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