I
Decorridas as eleições legislativas, os problemas que afetam a vida dos trabalhadores, dos reformados, da juventude não só aí estão, como têm vindo a agravar-se.
A atual situação económica e social é marcada pela continuada concentração da riqueza pelos grupos económicos, que contrasta com os baixos salários e pensões. Enquanto os principais grupos económicos acumulam 32 milhões de euros de lucros por dia, a maioria dos trabalhadores tem baixos salários, o mesmo acontecendo com as pensões da maioria dos reformados, que não permitem condições de vida dignas e cerca de dois milhões de pessoas estão em situação de pobreza, entre as quais mais de 300 mil crianças.
A atual situação é também marcada pelos défices estruturais, designadamente no plano produtivo, energético, tecnológico e demográfico; pela desvalorização da produção nacional e dos setores produtivos, acentuando a dependência do País; pelo crescente domínio de setores estratégicos pelos grupos económicos, nacionais e estrangeiros; pela imposição de um modelo económico assente em baixos salários e pensões e em setores de baixo valor acrescentado.
Prossegue o ataque aos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores, assim como a degradação dos serviços públicos. Crescem as dificuldades no acesso à saúde, seja pelo elevado número de utentes sem médico de família ou pelos elevados tempos de espera para consulta ou cirurgia, seja pelo sistemático encerramento de serviços de urgência.
A habitação está cada vez mais inacessível, com preços especulativos que alimentam os lucros da banca e dos fundos imobiliários. O desinvestimento na Escola Pública reflete-se na falta de professores e de trabalhadores não docentes, na desvalorização pedagógica e na deterioração do parque escolar.
Esta é a realidade de um País cada vez mais injusto e desigual. Consequência de décadas de política de direita levada a cabo pelos governos do PS, PSD e CDS, e que IL e CH pretendem ainda levar mais longe. Uma realidade marcada pelo favorecimento dos interesses dos grupos económicos; pelo ataque aos direitos dos trabalhadores, às funções sociais do Estado, aos direitos, liberdades e garantias consagradas na Constituição da República Portuguesa e ao regime democrático que dela emana. Uma realidade marcada também pela submissão do País às grandes potências e às imposições da União Europeia.
II
O Programa apresentado pelo XXV Governo Constitucional prossegue e aprofunda aquelas opções da política de direita, que nos trouxeram à situação em que estamos e que não servem o povo e o País.
O Programa do Governo PSD/CDS, nas opções que faz, no que nele consta e também pelas omissões, no que é explicito e no que está nas entrelinhas, deixa claro os objetivos e os interesses que serve, os interesses do capital. É assim na manutenção da injustiça na distribuição da riqueza que é criada pelos trabalhadores, na reconfiguração do Estado em função dos interesses dos grupos económicos, na destruição de serviços públicos para alimentar o negócio privado, na privatização de empresas e setores estratégicos da economia, na acentuação da injustiça fiscal. É disto que trata o Programa e é essa a política deste Governo.
Insiste numa política de baixos salários quando os lucros acumulados pelos grupos económicos comprovam que há recursos e condições para o aumento geral dos salários, designadamente quando adia para 2029 o valor do salário mínimo nacional de 1.100 euros, um valor inferior ao que hoje já é praticado em Espanha.
Anuncia uma verdadeira declaração de guerra aos trabalhadores com a intenção de rever a legislação laboral, não para reforçar os direitos dos trabalhadores, mas para a confirmar ainda mais com os interesses patronais, para aumentar ritmos de trabalho e desregular os seus horários de trabalho e assim agravar a exploração, utilizando mais uma vez a concertação social para esse objetivo.
A intenção de alterar a lei da greve, assume particular gravidade, porque pretende dificultar a resistência e a luta dos trabalhadores face à ação patronal que quer esmagar os seus direitos e condições de vida, para se apropriar de uma parte ainda maior da riqueza criada pelos trabalhadores.
Persiste na injustiça fiscal com a redução do IRC para 17%, que beneficia sobretudo as grandes empresas. Só em 2025, com a redução de 1 p.p. do IRC, o País perderá 365 milhões de euros de receita, essenciais para investir no Serviço Nacional de Saúde, na Escola Pública ou na habitação.
Nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado, a orientação é transformar direitos em negócio.
Assim é no ataque ao SNS, com as parcerias público privadas, USF modelo C, contratualizações e convenções, em vez de investir no reforço e na capacidade do SNS. Na educação, a intenção é a contratualização com os grupos privados da educação pré-escolar, no ensino artístico, profissional e na escola inclusiva; avançar com contratos de associação, desviando recursos da Escola Pública, e desistindo de criar uma rede pública de creches.
Na habitação, avançam com parcerias público privadas para imóveis públicos e o propósito de desproteger ainda mais os inquilinos no arrendamento, insistindo na receita falhada de colocar o direito à habitação nas mãos do dito “mercado”.
Na Segurança Social há uma clara aposta na subversão do modelo de repartição e de solidariedade intergeracional em que assenta o regime previdencial, fragilizando as suas fontes de financiamento e atacando o valor das reformas e pensões a pagar, retomando com novas roupagens a estigmatização dos que recebem prestações sociais neste âmbito.
Na ferrovia, anuncia-se a desagregação da rede e a entrega a privados, com concessões de linhas e estações ferroviárias, copiando o desastroso modelo Thatcher que agora é revertido na Grã-Bretanha.
Prossegue uma política de desvalorização da produção nacional e dos setores produtivos, e acentua o rumo das privatizações, desde logo a TAP, ou a Silopor colocando nas mãos dos grupos económicos empresas e setores estratégicos para o desenvolvimento do País.
Em nome de uma estafada reforma do Estado, sob a capa da modernização, da digitalização e da simplificação, o Governo prepara-se para moldar ainda mais o Estado em função dos interesses dos grupos económicos, reduzindo a capacidade da Administração Pública, atacando os direitos dos trabalhadores, pondo em causa a contratação de trabalhadores em falta em diversos serviços públicos e garantia de serviços públicos próximos das populações.
Coloca como grande prioridade atingir 2% da despesa para a guerra e para a corrida aos armamentos já em 2025, desviando recursos que deveriam ser mobilizados para responder aos problemas do povo português. Mais uma vez, não é a valorização dos direitos, carreiras e condições dos militares e o investimento necessário nas Forças Armadas Portuguesas para o cumprimento das suas missões constitucionais que está presente, mas sim a total subserviência à NATO, à União Europeia e aos EUA e à sua política belicista.
É um programa e uma política subordinada às imposições e condicionalismos da União Europeia, que impedem o nosso País de se desenvolver.
É um programa e uma política de retrocesso, de ataque a direitos, que empurra para o empobrecimento, contrária aos interesses dos trabalhadores, do povo e do País, em confronto com a Constituição da República Portuguesa.
Por tudo isto, a rejeição do Programa e da política do XXV Governo Constitucional é a única posição a assumir por quem se opõe e enfrenta os projetos e a agenda de retrocesso social, de ataque a direitos, de ostensivo confronto com a Constituição.
III
Os trabalhadores, os reformados, os jovens, as mulheres, os micro, pequenos e médios empresários, os pequenos agricultores e os pescadores, os emigrantes e os imigrantes, as populações, não encontrarão as soluções necessárias para resolver os seus problemas no programa e nas opções políticas do XXV Governo Constitucional.
O que é preciso para a elevação das condições de vida do povo e o desenvolvimento e progresso do País, é a rutura com a política de direita e a exigência de uma política alternativa que valorize o trabalho e os trabalhadores, os salários e as pensões; que reforce os direitos dos trabalhadores; que dê combate às desigualdades, às injustiças e à pobreza; que reforce a proteção social; que invista no Serviço Nacional de Saúde e na Escola Pública e garanta o direito à habitação e à cultura; que combata a corrupção; que promova a produção nacional e o apoio aos setores produtivos e às micro, pequenas e médias empresas; que combata as privatizações e assegure o controlo público de setores estratégicos da economia; que garanta o investimento público e a justiça fiscal; que valorize os profissionais das forças e serviços de segurança, das forças armadas, da justiça, dos bombeiros; que proteja o ambiente e combata a mercantilização da natureza; que promova a igualdade e combata as discriminações e às violências; que afirme a soberania e independências nacionais, a paz, a amizade e cooperação entre os povos, que cumpra a Constituição da República Portuguesa.
A presente Moção de Rejeição do Programa do Governo deixa claras as razões da rejeição do Programa e da política do Governo. Uma política que não serve nem o povo, nem o País. Uma política antidemocrática, de agravamento da exploração, das injustiças e desigualdades, de retrocesso que merece rejeição.
Perante ela é preciso clareza, uma clareza que só é possível com a votação desta Moção de Rejeição.
Nestes termos, ao abrigo do n.º 3 do artigo 192.º da Constituição, o Grupo Parlamentar do PCP propõe a rejeição do Programa do XXV Governo Constitucional.