Exposição de motivos
O direito à saúde conquistado pela Revolução de Abril, ficou consagrado na Constituição da República Portuguesa, em 1976. Determina a Constituição que incumbe ao Estado assegurar direito à saúde, nomeadamente através de um serviço nacional de saúde universal e geral, que foi criado em 1979.
Integrada no SNS, a Unidade Local de Saúde do Tâmega e Sousa (ULSTS) foi criada a partir da integração do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa com os agrupamentos de centros de saúde (ACeS) do Tâmega I – Baixo Tâmega (exceto o Centro de Saúde de Celorico de Basto), Tâmega II – Vale do Sousa Sul e Tâmega III – Vale do Sousa Norte. A ULSTS integra duas unidades hospitalares: o Hospital Padre Américo, em Penafiel, e o Hospital de São Gonçalo, em Amarante. Além disso, conta com 73 unidades funcionais distribuídas pelos 12 municípios da sua área de influência.
A ULSTS dá resposta em cuidados de saúde a cerca de 520 mil pessoas, numa região empobrecida e envelhecida, onde muitos serviços públicos foram enfraquecidos e onde falta uma rede de transportes públicos capaz de servir adequadamente os residentes e trabalhadores.
Na sua comunicação oficial, a ULSTS afirma que “ esta integração permite uma melhor articulação entre os diferentes níveis de cuidados de saúde, desde os cuidados primários aos cuidados hospitalares, otimizando a resposta às necessidades da população.
A ULSTS assume como missão a identificação das necessidades de saúde da sua população de referência e a garantia de uma resposta integrada a essas necessidades, procurando a melhoria dos níveis de saúde dessa mesma população, com ações focadas essencialmente na promoção da saúde e prevenção da doença.
A prestação de cuidados de saúde, adequados e em tempo útil, com garantia de elevados padrões de desempenho técnico científico, far-se-á com a eficaz e eficiente gestão dos recursos, através de uma adequada articulação entre os diferentes tipos de cuidados.
” Para lá das proclamações da comunicação oficial, a realidade que os utentes enfrentam diariamente é muito diferente.
O encerramento e desvalorização, pelos sucessivos governos, em relação ao Hospital São Gonçalo (encerramentos de maternidade, serviço de pediatria, serviços de urgência… e degradação dos serviços de radiologia e de cardiologia) leva a uma maior pressão sobre o Hospital Padre Américo, fazendo com que, na prática, não seja possível assegurar resposta hospitalar adequada aos utentes da região em muitas especialidades.
O subaproveitamento do Hospital de São Gonçalo é uma realidade por opção política dos sucessivos governos PS e PSD/CDS. Segundo informação que nos foi dada por anteriores Conselhos de Administração, um investimento de dois milhões de euros seria suficiente para aumentar a capacidade instalada desta ULS e dispensar avultados gastos com recurso a privados.
Com os mais diversos argumentos, foram sendo encerrados serviços ao longo dos anos, agravando os problemas de acesso a cuidados de saúde por parte de muitas pessoas, também pelo desinvestimento em meios materiais, com parca ou nenhuma renovação/atualização de dispositivos e equipamentos.
No âmbito de medidas adotadas durante a epidemia de Covid-19, foi encerrada a unidade de Saúde de Jazente, em Amarante, que ainda não foi reaberta.
Com o argumento de reorganização, encerraram-se os SASU de Paredes e Penafiel, para mais tarde reabrir somente em Paredes, o que contribui para aumentar a pressão sobre o serviço de urgência do Hospital de Padre Américo, por falta de outra resposta no concelho.
Mesmo serviços de atendimento permanente (SAP) que são apresentados como estando em funcionamento apresentam uma realidade diferente. É disso exemplo o do concelho de Baião, onde, entre o anúncio de existência de um SAP com funcionamento 24h/dia e a realidade, a diferença é brutal. Veja-se o que aconteceu no primeiro semestre do ano passado:
xJaneiro:17 dias sem médico, onze dias com médico apenas 12 horas, um dia com médico apenas seis horas.
xFevereiro: 18 dias sem médico, nove dias com médico apenas 12 horas, um dia com médico somente seis horas.
xMarço: 14 dias sem médico, oito dias com médico apenas 12 horas.
xAbril: 13 dias sem médico, dez dias com médico apenas 12 horas.
xMaio: 17 dias sem médico, sete dias com médico apenas 12 horas.
xJunho: nove dias sem médico, dez dias com médico apenas 12 horas No que diz respeito a exames de diagnóstico e terapêutica, a região depende de serviços privados, que definem critérios de resposta e prioridade de natureza economicista – quem tem seguro de saúde passa à frente –, traduzindo-se em transferência de verbas do SNS para instituições privadas, onde os exames auxiliares de diagnóstico e terapêutica são realizados por profissionais desintegrados da equipa médica que acompanha o utente, com atrasos consideráveis e frequentemente com falha na partilha dos resultados.
Outro problema grave é a incapacidade para oferecer soluções atempadas e de qualidade nos cuidados de Medicina Física e de Reabilitação. A demora na resposta aos utentes da ULSTS é angustiante e claramente insuficiente para atender às necessidades da população.
Mesmo em situações urgentes, como reabilitação pós-cirúrgica ou pós-AVC, a continuidade do tratamento dentro do período recomendado é comprometida. Os tempos de espera superam em muito o recomendado e os atrasos sucessivos levam os utentes a procurar acompanhamento em instituições privadas próximas. Lá, enfrentam a mesma situação: listas de espera que, em média, variam de quatro a seis meses, dependendo da gravidade do caso, gerando desespero em muitos desses utentes.
Uma realidade desta ULS é o recurso à contratação de camas de internamento aos Cuidados Continuados e aos hospitais privados. Os doentes têm alta célere do hospital após internamento, mas não vão para casa: são encaminhados para unidades de internamento privadas, que cobram um valor diário ao hospital pela prestação desses cuidados, mas falham redondamente.
Doentes relatam que ficam, na maioria dos casos, sem cuidados de reabilitação ou de enfermagem adequados, as informações clínicas não são partilhadas com a equipa médica que segue o doente durante o internamento hospitalar, que muitas vezes nem sabem onde os doentes se encontram e, quando voltam a ter contacto com os doentes, em consulta de seguimento pós internamento. É como se houvesse um vazio de continuidade de cuidados enquanto estiveram nestas instituições. Frequentemente, os cuidados ao doente nos quais investiram durante o período hospitalar são perdidos.
Esta situação das “MAC” (camas fora do hospital) é muito pouco transparente para os profissionais de saúde e para os doentes e suas famílias. A articulação com a ULSTS não existe em termos clínicos, pois funciona como uma mera transação económica.
Sem serem exaustivos, os exemplos apontados confirmam que, na prática, nem o Estatuto do SNS nem a Constituição estão a ser cumpridos, porque o Estado não está a assegurar o acesso a cuidados de saúde à população do Tâmega e Sousa.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte Resolução A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que implemente um plano de capacitação da Unidade Local de Saúde do Tâmega e Sousa que assegure a capacidade de resposta a partir do SNS às necessidades de cuidados de saúde da população daqueles concelhos através das seguintes medidas:
a) Contratação e fixação de profissionais que permitam garantir o efetivo funcionamento de todos os serviços;
b) Planificação da reabertura, até ao final de 2026, de unidades e serviços encerrados ao longo dos anos, garantindo meios humanos, físicos e materiais adequados ao correto funcionamento dos serviços;
c) Criação de um plano de apetrechamento dos centros de saúde e das unidades hospitalares dotados dos equipamentos necessários à prática clínica e à realização de exames de diagnóstico e terapêutica que garantam o reforço da resposta no SNS na região;
d) Reforço da capacidade de resposta do SNS na região na área da reabilitação física.